sexta-feira, 28 de novembro de 2014

A domesticação das asas

                                A DOMESTICAÇÃO DAS ASAS

quando a chuva tocar a terra
as aves saberão despertar da agonia estival
os temperos rupestres hão-de exalar
os odores recomendados
pelos sete sábios da Grécia Antiga

aguardemos que as figueiras excêntricas,
antes do vicejar dos frutos apetecíveis,
descerrem por fim as alvas flores de lírio
e que nos seus ramos engatilhados
sejam proibidas aquelas cordas submissas
onde se penduram homens de pele baça
no temor de um futuro
açulado por cães proscritos e lazarentos

com o chão bêbado pela água baptismal
tu irás recuperar as asas sedentárias
para te aconchegarem
- é certo que contrariada-
na tepidez monótona do meu regaço,
o teu peito libertando um desditoso queixume

depois, ao fazermos um amor sereno
proibidas todas as pressas
vasculhamos as pregas recônditas dos nossos corpos
beijamo-nos nas salivas das bocas acossadas
e
de olhos cheios recusaremos os vendavais inúteis

hei-de ler-te então um parágrafo
daquela perpétua, serena  e leal afeição
tal como  a quero e conjecturo
(estou a pensar em Corin Tellado, porque não?)

é certo que tu, meu bem-amar,
desejavas tão-somente
consumir-te  nos versos desinquietos
da Natália insubmissa,
esses versos onde o amor fiel e perpétuo
por demasiado tacanho
não cabe

         in Poesia dos Objectos Inúteis (2014 - Novembro)

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